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Uso da adrenalina na PCR: Quando começar a usá-la? | Colunistas

Uso da adrenalina na PCR: Quando começar a usá-la? | Colunistas

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Tudo que você precisa saber sobre o uso da adrenalina em uma PCR. Aprenda quando deve ser iniciado seu uso e mais!

Uma parada cardiorrespiratória (PCR) pode ser, e na maioria das vezes é um evento desafiador para todo médico que se depara com ela, seja um recém-formado ou um profissional mais experiente.

Parada cardiorrespiratória (PCR)

O fato é que a condução adequada de uma PCR depende de uma série de habilidades que o profissional deve ter:

  • Coordenação;
  • Liderança;
  • Conhecimento teórico;
  • Habilidade de tomar decisões rápidas.

Referente ao conhecimento, temos diversos pontos a serem dominados, sendo um deles o uso de nossa “querida” adrenalina.

Quem nunca viu um seriado de televisão, ou já presenciou algum plantão, algum treinamento médico, em que ouvimos aquela célebre frase: “prepare adrenalina 1mg”, “administre adrenalina 1mg agora”.

Pois é, saber como e quando usar adrenalina é um ponto importante na condução de qualquer PCR, para que possamos de maneira adequada fazer com o paciente tenha retorno à circulação espontânea (do inglês “ROSC”).

Neste artigo nosso foco será ensinar a você mais do que simplesmente “como usar a adrenalina”, e sim a identificar os ritmos de PCR, identificar os momentos nos quais a droga deve ser administrada, e alguns detalhes a mais que, para quem ficar até o final, iremos descobrir. Vamos lá, então?

O que é a adrenalina?

A adrenalina é um hormônio secretado pela medula das glândulas suprarrenais. Ele exerce algumas funções importantes no corpo humano, como:

  • Fundamental no mecanismo da elevação da pressão sanguínea;
  • Importante na produção de resposta fisiológica rápida do organismo aos estímulos cardíacos;
  • Vasoconstritor nas hemorragias da pele;
  • Prolongar os efeitos anestésicos locais;
  • Relaxante muscular na asma brônquica.

Características farmacológicas da adrenalina

Segundo a ANVISA, nas características farmacológicas para os profissionais de saúde, a adrenalina, hormônio da medula da suprarrenal, produz reações similares àquelas originadas pela estimulação dos nervos adrenérgicos.

Suas ações mais proeminentes são sobre os receptores das fibras musculares lisas, células glandulares e sobre o coração:

  • Estimula o coração;
  • Acelera os batimentos cardíacos;
  • Aumenta a pressão arterial;
  • Promove a constrição das arteríolas;
  • Relaxa os músculos bronquiais e intestinais;
  • Age com eficácia, em casos indicados, na reanimação cardíaca.

Nesse contexto, nos deparamos muitas vezes com situações de perda súbita e inesperada da função cardíaca, respiração e consciência, esse é o conceito de PCR (Parada Cardiorrespotatória) e por vezes abre-se mão do uso da adrenalina para auxiliar na responsividade do paciente.

O paciente em PCR pode apresentar 2 tipos de situações: Não chocáveis (Assistolia e AESP) e Chocáveis (Taquicardia Ventricular – TV e Fibrilação Ventricular – FV).

Cadeia de sobrevivência da PCR

Na PCR ocorre comprometimento hemodinâmico progressivo, de modo que o retorno à circulação espontânea se torna o objetivo primordial do procedimento médico nesses casos.

Para atingir esse objetivo, foi formulada a cadeia de sobrevivência, que abrange ações de suporte básico e suporte avançado de vida. Nela, propõe-se:

  1. Reconhecimento precoce de uma parada com acionamento do serviço de emergência;
  2. Manobra de ressuscitação cardiopulmonar (RCP) imediata e de alta qualidade;
  3. Desfibrilação rápida;
  4. Prestação dos serviços médicos básicos e avançados de emergência acionados;
  5. Continuação do suporte avançado de vida e cuidados pós-parada (nível necessariamente intra-hospitalar).
Fonte: blog da rcp

No quarto elo da cadeia de sobrevivência, já em suporte avançado (4º e 5º elos da cadeia), tem-se usado classicamente a adrenalina, tendo em vista sua ação alfa-adrenérgica de vasoconstrição e aumento da pressão de perfusão coronariana.

Esta última seria um fator relevante de estimulação cardíaca. Ao longo do tempo em que tem sido utilizada, a adrenalina tem confirmado os efeitos esperados e contribuído para o estabelecimento do retorno à circulação espontânea.

Por outro lado, estudos recentes questionam a escala de benefício do uso de adrenalina e apontam possíveis riscos aos pacientes submetidos a esta intervenção.

Guidelines atuais: a adrenalina em seu tempo e dosagem na PCR

De acordo com o Protocolo em Suporte Avançado do Ministério da Saúde (SUS, 2016), respaldado nos Guidelines da American Heart Association de 2015, preconiza-se o uso da adrenalina após as seguintes etapas:

  1. Confirmação do quadro de PCR – inclui checagem de responsividade (a mesma da escala de Glasgow), com subsequente verificação de respiração e pulso central (carotídeo). Observação: se respiração ausente (ou gasping) e pulso presente, tratar como parada respiratória.
  2. Posicionamento do paciente – o paciente deve estar em decúbito dorsal sobre uma superfície rígida, plana e seca.
  3. Requisição da maleta de drogas e de vias aéreas.
  4. Compressões torácicas – 30 compressões eficientes, alternadas por 2 insuflações de via aérea eficientes.
  5. Desfibrilador (DEA/Cardioversor) assim que possível para análise do ritmo.

Se o rítmo for chocável

Se o ritmo for chocável (FV/TV), executar desfibrilação. Reiniciar ciclos de compressões torácicas com insuflações imediatamente após o choque por 2 minutos. Após isso, executar nova desfibrilação.

Enquanto a segunda maratona de ciclos compressões-insuflações é executada o acesso venoso ou intra-ósseo já deve estar sendo garantido.

Dosagem da adrenalina no rítmo chocável

Após a segunda desfibrilação, já preconiza-se iniciar a administração IV/IO de adrenalina, 1mg em bolus, seguido de 20ml de solução salina 0,9% e elevação dos membros inferiores para otimização do retorno venoso.

Novos bolus de adrenalina (1mg IV/IO) devem ser administrados a cada 3 a 5 minutos.

Medicamentos antiarrítmicos podem ser utilizados em casos chocáveis após essas etapas, de preferência a amiodarona. Na ausência dela, pode-se utilizar a lidocaína.

Ainda, a equipe em atendimento deve observar as possíveis causas reversíveis associadas àquela parada (os “5Hs” e os “5Ts”).

  • 5Hs: Hipóxia, Hipovolemia, Hidrogênio (se refere a acidose metabólica), Hipo/Hipercalemia, Hipotermia.
  • 5Ts: Tamponamento cardíaco, Trombose coronariana (IAM), Trombose pulmonar (TEP), Toxinas, Tensão no tórax (Pneumotórax hipertensivo).

Caso alguma destas causas seja identificada, seguirão os medicamentos apropriados para cada condição com suas respectivas posologias.

Se o rítmo não for chocável

Se o ritmo for não chocável (assistolia/AESP), realizar novo ciclo compressões-insuflações por 2 minutos, imediatamente após a análise do ritmo. Após isso, verificar novamente o ritmo para confirmá-lo ou não (excluindo problemas técnicos do verificador).

Em caso de assistolia/AESP confirmada, reiniciar novamente o ciclo compressões-insuflações por 2 minutos, seguido por nova análise do ritmo e assim sucessivamente.

Dosagem da adrenalina na PCR de rítmo não chocável

Neste ponto, após a confirmação do ritmo não chocável (2ª análise de ritmo), deve-se administrar a adrenalina o mais rápido possível, na mesma posologia previamente mencionada (1mg IV/IO em bolus, seguido de 20ml de solução salina 0,9% e elevação dos membros inferiores para otimização do retorno venoso).

Novos bolus de adrenalina 1mg IV/IO devem ser administrados a cada 3 a 5 minutos.

Etapas subsequentes

As etapas subsequentes incluem ciclos de 2 minutos e 30 compressões: 2 insuflações intercaladas por análises de ritmo. As demais intervenções ocorrerão concomitantemente a este esquema principal.

Instalação de dispositivo de via aérea avançada, definição de encaminhamento e registro dos achados clínicos e procedimentos realizados são, de maneira geral, processos que devem ocorrer enquanto os procedimentos já descritos estão sendo realizados.

Fonte: http://publicacoes.cardiol.br/portal/abc/portugues/2019/v11303/pdf/11303025.pdf

Então, como eu uso a adrenalina na PCR?

De antemão, vamos lembrar-nos dos tempos: A adrenalina deve ser realizada a cada 3-5 minutos e na dose de 1mg em adultos. Lembre-se de que, se você estiver lidando com uma criança, a dose é de 0,1mL/kg.

Para facilitar, se você estiver diante de uma criança, pegue uma ampola de adrenalina e dilua em 9mL de soro fisiológico, e assim, a partir dessa concentração, efetue a dose indicada na criança.

Quando o paciente apresentar ritmos chocáveis, o próprio nome já sugere que é mais importante aplicar a desfibrilação e iniciar a RCP de qualidade, antes de pensar em usar adrenalina.

Protocolos da AHA

Segundo os protocolos da AHA, a administração da adrenalina em ritmos chocáveis deve acontecer após o segundo choque efetuado no paciente.

Na figura abaixo, é apresentado o protocolo do ACLS, no qual a adrenalina é administrada após o segundo choque, e então, caso o paciente não obtenha ROSC, a próxima droga a ser administrada será amiodarona (300mg – 2 ampolas) ou lidocaína (1,5mg/kg).

Assim, a adrenalina só voltará a ser administrada após o quarto choque. Lembre-se que após o quinto choque, amiodarona deverá ser repetida na dose de 150mg – 1 ampola, ou lidocaína na dose de 0,75mg/kg.

E então, caso o paciente não obtenha ROSC, a terceira adrenalina será efetuada após o sexto choque. Posteriormente a este, a mesma continuará a ser realizada a cada 3 – 5 minutos, já que não usaremos outras drogas.

Rítmos não chocáveis

Em relação aos ritmos não chocáveis, a adrenalina deve ser prontamente realizada assim que estiver disponível. Não retarde a administração da mesma, já que ela é parte importante da RCP.

Lembre-se de que, nos ritmos não chocáveis, devemos procurar corrigir causas reversíveis durante o processo de ressuscitação (os 5Hs e 5Ts).

Discussões sobre risco-benefício

Nos últimos anos, o uso da adrenalina em casos de PCR foi questionado. Isso porque, em alguns estudos observacionais, foi possível associar administração de adrenalina à piora de desfecho neurológico.

Porém, em todos eles foram apontados vieses de indicação, ou seja, pacientes com paradas mais prolongadas são mais prováveis de receber adrenalina, justamente os pacientes com maior risco de piores desfechos.

Como ponto favorável, tem-se confirmado estatisticamente que a ação vasoconstritora da adrenalina (por estimulação dos receptores alfa-1 da musculatura lisa vascular) aumenta a pressão aórtica na diástole, e, consequentemente, melhora as pressões de perfusão cerebral e coronariana.

A pressão de perfusão coronariana tem sido associada ao retorno da circulação espontânea na PCR. No entanto, apesar dos efeitos com a “macrocirculação” serem os esperados, percebeu-se que o fluxo sanguíneo na “microcirculação” é prejudicado, o que traria algum prejuízo neurológico ao paciente.

Ademais, uma vez que o retorno à circulação espontânea fosse atingido, altas doses plasmáticas de adrenalina causariam taquicardia (significando maior demanda por oxigênio) e possíveis arritmias.

Relembrando alguns conceitos

  • Assistolia: Ausência total de atividade elétrica ventricular. CA: Checar cabos; GA: Aumentar o ganho do aparelho; DA: Mudar a derivação.
  • AESP: Atividade Elétrica Sem Pulso. Uma atividade elétrica organizada que não é efetiva para gerar pulso. Identificar a causa: 5 H’s (Hipovolemia, Hipóxia, H+ [acidose], Hipotermia, Hipo/Hipercalemia) e 5 T’s (Toxinas, Trombose cardíaca (IAM), Tamponamento cardíaco, Tensão pulmonar, TEP).
  • Taquicardia ventricular sem pulso: 3 ou mais complexos ventriculares prematuros sucessivamente em uma frequência cardíaca maior que 100 BPM/min.
  • Fibrilação ventricular: Ritmo caótico que começa nos ventrículos. Despolarização desorganizada.

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  • Autores: Ana Carolina da Costa, Antônio Freire, Yago Henrique Padovan.

Sugestão de leitura complementar

Assista ao vídeo sobre parada cardiorrespiratória

Referências

  1. MARTINS H S, SANTOS R , ARNAUD F et al. Medicina de Emergência: Revisão Rápida. 1ª edição. Barueri, SP: Manole, 2016.
  2. CEDRO, M.; OLIVEIRA, C.Q.  Yellowbook Fluxos e Condutas: Emergência 3ª Edição. Salvador: Editora Sanar, 3ªed., 2022.