Traumatismo cranioencefálico (TCE) | Colunistas

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Narrativa

José tem 20 anos e, devido a um acidente automobilístico há dez meses, sofreu um traumatismo cranioencefálico (TCE), cujas repercussões acometeram predominantemente o córtex cerebral. Embora seja descrita a sua recuperação, ele ainda apresentava afasia, e fraqueza e perda de sensibilidade na mão direita, de modo a deixá-lo apreensivo quanto à sua recuperação e ao seu retorno à faculdade de Medicina, que cursava até então.

Introdução

A princípio, faz-se crucial definir esse tipo de neurotrauma como uma “agressão de ordem traumática que acarrete lesão anatômica ou comprometimento funcional do couro cabeludo, crânio, meninges, encéfalo ou seus vasos”, conforme Gaudêncio e Leão (2013). Nesse sentido, é importante elencar as vertentes da epidemiologia, da biopatologia, do tratamento e do prognóstico em relação ao TCE.

Estudo do caso

Epidemiologia

Sob uma inspeção epidemiológica, nota-se que o traumatismo em questão é uma das principais causas tanto de incapacidade ou deficiência quanto de morte, destacando-se ainda mais na população jovem, à qual pertence José.

Além disso, por volta de 50% desses traumatismos acometem o encéfalo e são predominantes entre 15 e 24 anos, semelhantemente à situação do quadro clínico, em que houve lesão encefálica em um indivíduo de 20 anos.

Por fim, cabe ressaltar que a prevalência do TCE é quatro vezes maior na população masculina, especialmente associada a acidentes automobilísticos, outro ponto em comum com o caso.

Biopatologia

Com base em um panorama biopatológico, sugere-se que o estudo inicie pela observação das fraturas do crânio. Embora raramente provoquem problemas de forma isolada, elas auxiliam a detectar lesões com potencial de gravidade, de maneira que “o prognóstico depende mais da natureza e da intensidade da lesão encefálica que da intensidade da lesão craniana”, de acordo com Louis, Mayer e Rowland (2018). Tendo isso em vista, é possível classificar a fratura de José como fratura com afundamento, visto que um ou mais fragmentos ósseos deslocaram-se em sentido interno, comprimindo o encéfalo subjacente do rapaz.

Pode-se dizer, também, que o trauma ocasionou lesão das áreas corticais relacionadas com a sensibilidade somática, na parte inferior do giro pós-central, seguindo a correspondência do homúnculo de Penfield para as mãos. Já no que se refere à afasia, a classificação adequada é a de Broca, na qual, apesar de o paciente ser capaz de compreender a fala, não consegue expressar-se por meio da linguagem. Neste tipo de afasia, as partes opercular e triangular do giro frontal inferior (área 44 e 45 de Brodmann) são as afetadas.

Enfim, não apenas pela área cortical de linguagem localizar-se à esquerda na maioria da população, como também pela sensibilidade ser uma informação cruzada na medula, é possível inferir que o lado lesionado no quadro em discussão foi o esquerdo.

Tratamento

Em relação ao tratamento, sugere-se a craniotomia, dado que ocorreu o comprometimento da região cortical na situação já ilustrada. Esse procedimento consiste na retirada de um “retalho ósseo” com rebatimento da dura-máter, a fim de aliviar a compressão antes exercida sobre o tecido cortical e, consequentemente, diminuir os prejuízos neurológicos no paciente.

Além disso, deve-se manter uma rotina de monitoramento regrada, na qual se realizará avaliações neurológicas seriadas; observação das vias respiratórias e ventilação; e manejo da pressão arterial, dos líquidos corporais e da temperatura.

Prognóstico

No intuito de abordar essa análise integralmente, por fim, contempla-se o fator prognóstico para a condição de José. A princípio, por ser um paciente jovem e estar em processo de recuperação evolutivo, tudo leva a crer que ele conseguirá voltar às atividades do seu dia a dia.

Desorientação, agitação, déficits cognitivos e motores, cefaleia, tontura, vômitos e vertigem são comuns no período pós-traumático, mas em geral desaparecem após algumas semanas. Assim, tudo leva a crer que o paciente não sofrerá mais com isso, visto que já se passaram dez meses desde o ocorrido.

O desenvolvimento de depressão em cerca de 40% dos sobreviventes é outro ponto importante a se destacar, pois o quadro clínico colocado envolve complexas influências psicológicas sobre o estudante.

Portanto, ainda que sequelas sejam frequentes após as lesões encefálicas, ocorre uma melhora significativa dos sinais e sintomas mais graves, podendo permitir o retorno limitado de José ao curso de Medicina. Com isso, a instituição precoce de terapia cognitiva, fisioterapia e terapia ocupacional fazem-se de suma importância na evolução pós-traumática e, consequentemente, na sua volta à rotina normal.


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

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Referências

GAUDÊNCIO, T. G.; LEÃO, G. M. A Epidemiologia do Traumatismo Crânio-Encefálico: Um Levantamento Bibliográfico no Brasil. Rev. Neurocienc. Teresina, v. 21, n. 3, p. 427-434, 2013. Disponível em: http://revistaneurociencias.com.br/edicoes/2013/RN2103/revisao/814revisao.pdf>.

Acesso em: 26 nov. 2020.

KANDEL, E. R. Princípios de Neurociências. 5a. ed. Porto Alegre. MC HILL, 2014.

LOUIS, E. D.; MAYER, S. A.; ROWLAND, L. P. Merritt Tratado de Neurologia. 13a. ed. Rio de Janeiro. Guanabara Koogan, 2018.

MACHADO, A. B. M. Neuroanatomia Funcional. 3a. ed. Rio de Janeiro. Ed. Atheneu, 2014.

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