Confira os principais conceitos sobre semiologia abdominal e as etapas de avaliação – inspeção, ausculta, percussão e palpação!
A semiologia é a ciência que estuda os sinais e sintomas das doenças. No contexto abdominal, a semiologia envolve a avaliação cuidadosa de sinais clínicos que podem indicar patologias no abdome. A avaliação é composta por várias etapas para garantir uma análise detalhada.
Dessa forma, o objetivo deste artigo é trazer um resumo sobre semiologia abdominal, a importância de estudar esse tema, como conduzir essa avaliação e os principais achados clínicos. Além disso, vale ressaltar que dominar os principais conceitos e técnicas é fundamental para a prática médica.
Importância de dominar a semiologia abdominal
O abdome é uma região complexa que abriga órgãos vitais do corpo humano, incluindo o trato gastrointestinal, fígado, baço e pâncreas. Por isso, a avaliação semiológica abdominal é crucial para identificar patologias que podem variar de condições benignas a emergências médicas graves.
Quais sãos as regiões abdominais?
O abdome é a região do corpo localizada entre o tórax e a pelve. Dessa forma, sua abertura superior é voltada para o tórax e cercada pelo diafragma; já a parte inferior se abre para a pelve, comunicando através da abertura pélvica superior. Assim, essas duas aberturas, em conjunto com as paredes abdominais, delimitam a cavidade abdominal.
Além disso, a cavidade abdominal é divida por quatro planos: dois horizontais e dois verticais, delimitando as seguintes regiões:
- Hipocôndrio direito (HCD): fígado, vesícula biliar, rim direito;
- Epigástrio: lobo esquerdo do fígado, piloro, duodeno, cólon transverso e cabeça bem como corpo do pâncreas;
- Hipocôndrio esquerdo: baço, estômago, rim esquerdo, cauda do pâncreas;
- Flanco direito (ou região lateral): cólon ascendente, rim direito e jejuno;
- Mesogástrio (ou região umbilical): duodeno, jejuno, íleo, aorta abdominal, mesentério, linfonodos;
- Flanco esquerdo (ou região lateral): cólon descendente, jejuno, íleo;
- Fossa ilíaca direita (ou região inguinal): ceco, apêndice, ovário bem como tuba uterina direita;
- Hipogástrio: bexiga, útero, ureter;
- Fossa ilíaca esquerda (ou região inguinal): cólon sigmoide, ovário e tuba esquerda.
A cavidade abdominal também pode ser divida em quatro quadrantes. A partir do plano mediano (vertical), seguindo o trajeto da linha alba e o plano transumbilical (horizontal) entre L3 e L4.

Assim, a partir do exame físico minucioso e história clínica do paciente, é possível estabelecer suspeitas diagnósticas, a depender da região acometida. Abaixo veremos passo a passo como realizar o exame físico do abdome.
OBS: diferente do sistema cardiovascular e respiratório, a ausculta deve ser o primeiro elemento a ser avaliado após a inspeção. A explicação é que a palpação ou percussão do abdome pode alterar os movimentos peristálticos.
Objetivos da semiologia abdominal
- Identificação de sinais clínicos que podem sugerir a presença de doenças;
- Avaliação da dor abdominal;
- Estabelecer uma lista de possíveis diagnósticos baseados nos achados clínicos;
- Direcionar a necessidade de exames laboratoriais e de imagem.
Abordagem sistemática da avaliação abdominal
- Posição do paciente: Decúbito dorsal, com os braços ao lado do corpo para evitar tensão nos músculos abdominais.
- Ambiente: tranquilo e bem iluminado.
- Sequência de exame: Inspeção, ausculta, percussão bem como palpação, seguindo essa ordem para minimizar a interferência nos achados clínicos.
A seguir é possível conferir mais orientações sobre cada etapa da sequência do exame.
Inspeção na semiologia abdominal
A inspeção deve ser realizada com o paciente em decúbito dorsal com pernas estendidas. São observadas a forma ou tipo, simetria, volume e alterações cutâneas do abdome.
- Forma ou tipo: globoso (panículo adiposo ou líquido ascítico), escavado (emagrecimento ou síndrome consuptiva), pendular (gravidez);
- Simetria: Avaliar se há presença de assimetria, como pode ocorrer na hepatoesplenomegalia, hérnias de parede abdominal, neoplasias bem como obstruções;
- Abaulamentos: presença de massas abdominais, como neoplasias ou hérnia da parede abdominal;
- Retrações (depressões): bridas pós-cirúrgicas, caquexia;
- Circulação colateral: pode ser visível em caso de obstrução do sistema venoso porta (cabeça de medusa) ou veia cava;
- Cicatriz umbilical: normal, plana, tendência à retificação, protrusa
- Ondas peristálticas: em geral não são observadas em indivíduos normais, mas pode estar presente quadros obstrutivos;
- Pulsação;
- Movimentos respiratórios;
- Lesões cutâneas: sinal de Cullen e sinal de Turner, presentes na pancreatite aguda.
Ausculta na semiologia abdominal
Deve ser realizada nos quatro quadrantes de forma superficial para avaliar os ruídos hidroaéreos, presença de sopros nas artéria aorta, artérias renais, ilíacas e femorais e atrito entre o figado e o baço.
Além disso, para os ruídos hidroaéreos, deve-se descrever a descrever intensidade (++++/IV) e se estão presentes/normais, diminuídos ou ausentes, aumentado.
Assim, para avaliar alterações do fluxo aórtico (sopros ou aneurismas), aprofunda-se o estetoscópio ao longo do trajeto da aorta. Confira na figura abaixo quais os pontos de ausculta:

As principais alterações a serem pesquisadas na ausculta são:
- Peristaltismo de luta: obstrução;
- Íleo paralítico: silêncio abdominal;
- Sopros vasculares: sugerem aneurismas e compressões arteriais.
Palpação abdominal
A palpação abdominal é dividida em dois momentos: a superficial e a profunda. Iniciamos com a primeira, para posteriormente ir para segunda.
Palpação superficial
Ela serve para avaliar:
- Sensibilidade;
- Integridade anatômica;
- Grau de distensão da parede abdominal;
- Defesa da parede abdominal (contratura da musculatura abdominal, voluntária ou involuntária);
- Continuidade da parede (hérnias, diástase dos músculos reto abdominais).
Os pacientes com dor abdominal devem ser solicitados a localizá-la. Só então inicia-se a palpação da área mais distante da região dolorosa, deixando esta por último. Deve ser feita com uma mão a 45 graus ou duas mãos superpostas.
Pontos dolorosos:
- Epigástrico: sensível na úlcera péptica em atividade;
- Cístico: situa-se no ângulo formado pelo rebordo costal direito com a borda externa do músculo reto abdominal. Na interseção da linha hemi clavicular com o rebordo costal direito. Portanto, deve ser palpado em busca do Sinal de Murphy que pode estar presente na colecistite aguda.
- McBurney: união do terço externo com dois terços internos da linha que une a espinha ilíaca ântero-superior à cicatriz umbilical. Dor nessa região sugere apendicite aguda. Dessa forma, o Sinal de Blumberg, em que o paciente refere dor a descompressão, pode ser pesquisado na palpação profunda.
Palpação profunda
Este tipo de palpação tem como objetivo palpar órgãos abdominais em busca de visceromegalias bem como de tumorações. Os órgãos que procuramos são o fígado e o baço:
Palpação do fígado
No fígado devemos observar o tamanho (hepatimetria), consistência, superfície e borda e sensibilidade.
O método de palpação mais utilizado na prática é o de Lemos Torres. Nele, o examinador com a mão esquerda na região lombar direita do paciente tenta evidenciar o fígado para frente. Além disso, com a mão direita espalmada sobre a parede anterior, tenta palpar a borda hepática anterior durante a inspiração profunda.
Assim, deve-se avaliar a borda hepática, se tem borda fina ou romba; regularidade da superfície, sensibilidade, consistência, presença de nodulações.
A hepatimetria deve ser realizada percutindo dois pontos:
- A partir do 5º espaço intercostal direito em direção ao rebordo
costal direito, até que haja mudança do som (de maciço para timpânico); - A partir do apêndice xifoide
Dessa forma, a hepatimetria normal varia entre 6 e 12 cm na linha hemiclavicular e entre 4 e 8 cm na linha esternal média.

Palpação do baço na semiologia abdominal
Normalmente o baço não é palpável. Porém, quando atinge duas ou três vezes seu tamanho normal (esplenomegalia), é possível palpá-lo.
Dessa forma, para palpá-lo, o examinador posiciona-se à direita do paciente e com a mão direita em garra tenta sentir o polo esplênico inferior durante a inspiração profunda próximo ao rebordo costal esquerdo.
Causas de esplenomegalia: hipertensão portal, infecção, anemia hemolítica, linfomas, esquistossomose.
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Percussão na semiologia abdominal
A partir da percussão é possível identificar presença de ar livre, líquidos e massas intra-abdominais. Além disso, é importante delimitar o espaço de Traube (onde fica o baço).
A técnica é digito-digital, em que o examinador posiciona uma das mãos sobre o abdome e assim o percute com o dedo indicador.
- Som normal: maciço (baço e fígado), timpânico (vísceras ocas);
- Percussão normal: macicez hepática no hipocôndrio direito; timpanismo no espaço de Traube, timpanismo nas demais regiões;
- Massas abdominais sólidas ou líquidas (ascite) são maciços;
- Timpanismo generalizado pode indicar obstrução.
Paciente com ascite: manobras
Algumas manobras são fundamentais para avaliar o paciente com suspeita de ascite, que é o acúmulo de líquido na cavidade peritoneal. Dessa forma, essa avaliação baseia-se na percussão, como veremos nas duas principais manobras abaixo:
- Macicez móvel: ocorre em casos de ascite de médio volume. Dessa forma, quando o paciente está em decúbito dorsal o líquido acumula-se na região lateral do abdome, revelando timpanismo na região anterior. Além disso, quando o paciente posiciona-se em decúbito lateral, o líquido desloca-se para o mesmo lado, onde fica maciço e a região acima fica timpânica.
- Semi-círculo de Skoda: com o paciente em decúbito dorsal percute-se a regiçao periumbilical do meio para as extremidades e, portanto, em casos de ascite, observa-se alteração do timpanismo.
Algumas manobras de percussão
- Sinal de Giordano: punho-percussão das lojas renais. Se o paciente sentir dor, é positivo e pode indicar pielonefrite aguda.
- Sinal de Jobert: percussão do hipocôndrio direito com detecção de timpanismo. É indicativo de pneumoperitôneo (ar na cavidade abdominal).
- Sinal de Corvoisier-Terrier: vesícula biliar palpável. Pode ser indicativo de neoplasia.
Redação do exame do abdome normal
Exemplo de redação do exame de abdome:
ABDOME: plano, sem lesões de pele, cicatrizes, circulação colateral, retrações ou abaulamentos. Peristalse não identificável à inspeção. Ruídos hidroaéreos presentes nos quatros quadrantes (+/IV). Ausência de timpanismo difuso e macicez em flancos. Traube livre. Fígado e baço não palpáveis. Abdome indolor à palpação profunda e superficial.
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Referências
- MARTINS, M. A. et al. Semiologia Clínica. 1.ed. Santana de Parnaíba[SP]: Manole, 2021.
- PORTO, C. C. Semiologia médica. 7ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.




