O sarampo é uma doença respiratória aguda, altamente contagiosa, causada por RNA vírus do gênero Morbillivirus da família Paramyxoviridae e apresenta gravidade variável em populações de diferentes níveis socioeconômicos.
Além disso, a infecção caracteriza-se por febre, mal-estar, tosse, coriza, conjuntivite, seguidos de erupção cutânea. Após a exposição, cerca de 90% das pessoas suscetíveis irão desenvolver sarampo.
Ademais, é uma infecção clássica da infância que pode ser fatal e está na Lista Nacional das Doenças e Agravos de Notificação Compulsória. O Brasil tem empreendido um grande esforço para erradicar essa doença por vacinação, o que resultou em um significativo declínio da prevalência dela.
Epidemiologia do Sarampo
Trata-se de um vírus de ampla distribuição mundial, com incidência, evolução clínica e letalidade aparentemente influenciadas pelas condições socioeconômicas, além do estado nutricional e imunitário dos pacientes.
No ano 2000, a Organização Mundial da Saúde (OMS), estimou que havia entre 30 a 40 milhões de casos de sarampo no mundo, com 770 mil óbitos. A maior prevalência do sarampo é na infância, poupando lactentes menores de 6 meses pela persistência dos anticorpos maternos.
No Brasil, devido ao aumento da cobertura vacinal a partir da década de 1980 o número de óbitos por essa doença reduziu gradativamente e, em 2000, a circulação endêmica do agente etiológico foi interrompida e casos autóctones deixaram de acontecer. A partir desse ano ocorreram surtos isolados devido a casos importados até que, em setembro de 2016, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) entregou ao Brasil o certificado de eliminação do sarampo.
Todavia, as coisas mudaram de lá para cá, e o Brasil não é mais um país considerado livre do sarampo. Só no ano de 2018, foram 10.262 casos confirmados e no ano de 2019 foram notificados 561 casos, nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Pará.
Nesse contexto, vale lembrar que o sarampo é uma doença altamente contagiosa, o que reforça a importância da imunização populacional. Entretanto, a cobertura vacinal no país tem diminuído com o passar dos anos, sendo que esses dados apontam para um dos principais motivos do surto.
Transmissão do Sarampo
A transmissão dessa doença é direta e ocorre por secreções da nasofaringe expelidas por indivíduos contaminados ao falar, tossir, espirrar e respirar. Adicionalmente, já foi descrita em ambientes fechados a contaminação por aerossóis com partículas virais no ar.
O período de transmissibilidade, por sua vez, ocorre entre 4 e 6 dias antes do exantema até 4 dias após o seu aparecimento.
Fisiopatologia do Sarampo
A entrada do vírus ocorre com a sua inoculação no trato respiratório, pelas vias aéreas superiores, onde ele infecta linfócitos, macrófagos alveolares e células dendríticas.
Em seguida, o vírus sofre replicações sucessivas no epitélio da mucosa e dissemina-se através da via linfática, atingindo, posteriormente, a via sanguínea.
Com isso, é possível que o vírus cause uma viremia, engendrando uma elevada disseminação sistêmica do antígeno pelo corpo, devido à forma de infecção do vírus ocorrer por meio das células epiteliais e endoteliais dos órgãos (transmissão direta entre as células).
Além disso, o vírus pode instalar-se em tecidos como a conjuntiva, trato urinário, capilares sanguíneos, tecido linfático, sistema nervoso central e no trato respiratório, onde pode levar a necrose epitelial e a formação de células gigantes. Ademais, o agente viral causa certa repressão da resposta Th1 gerando imunossupressão.
A infecção das células endoteliais e dos linfócitos T gera a alteração macroscópica denominada exantema, um sinal característico dessa infecção viral.
Por fim, outros efeitos sistêmicos mais raros dessa viremia são uma encefalite pós-infecciosa de etiologia imunológica e uma panencefalite esclerosante subaguda, ocasionada por vírus mutantes no sistema nervoso central.
Caso a infecção seja tratada, o indivíduo adquire uma imunidade vitalícia devido à memória imunológica do organismo. Entretanto, caso esse quadro não seja revertido, o indivíduo pode evoluir a óbito devido a uma falha na imunidade mediada por células.
Quadro clínico do Sarampo
O sarampo possui um período de incubação que varia entre 7 e 18 dias, quando iniciam-se os sintomas prodrômicos da infecção, como febre e mal-estar.
Segundo o Guia de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde de 2019, divide-se o quadro clínico do sarampo em três fases bem definidas:
- Período prodrômico ou catarral;
- Período de estado ou exantemático;
- Período de convalescença ou de descamação furfurácea.
Período prodrômico
O período prodrômico tem duração média de 6 dias e ocorre no início da doença.
Nessa fase, todas as mucosas são comprometidas, resultando em um cortejo de sintomas muito característicos, como febre, tosse produtiva, coriza, lesões de mucosa e boca e linfadenomegalia.
Além disso, nas últimas 24 horas desse período, surge, na altura dos pré-molares, o sinal de Koplik, que caracteriza-se por pequenas manchas brancas com halo hiperemiado, sendo considerado um sinal patognomônico do sarampo.

Período exantemático
No período exantemático, o paciente apresenta piora de todos os sintomas descritos, com prostração importante. Além disso, nesse momento, também surge o exantema em surtos sucessivos.
O exantema típico do sarampo aparece cerca de dois a quatro dias após o início da febre. Trata-se de uma erupção maculopapular avermelhada, que inicia-se no rosto e na cabeça, espalhando-se em direção às partes inferiores do corpo. Além disso, inicialmente, as lesões apresentam coloração esbranquiçada, mas essa característica desaparece nos estágios mais avançados.
Por fim, a erupção cutânea resolve-se em cinco a seis dias, desaparecendo na mesma ordem em que surgiu.

Período de convalescença
Por fim, no período de convalescença, as manchas tornam-se escurecidas e, além disso, surge uma descamação fina, que lembra farinha, característica descrita no nome da fase – descamação furfurácea.
Complicações do Sarampo
As complicações do sarampo incluem infecções secundárias, como diarreia e pneumonia.
Em indivíduos imunocomprometidos, por sua vez, destacam-se complicações como pneumonia de células gigantes e encefalite por corpos de inclusão do sarampo. Outra complicação rara é a encefalite aguda primária associada ao sarampo.
Os grupos com maior risco de desenvolver complicações incluem pessoas imunossuprimidas, gestantes, indivíduos com deficiência de vitamina A ou má nutrição, além de crianças e idosos.
Além disso, entre as síndromes neurológicas que associam-se à infecção pelo vírus do sarampo estão a encefalomielite disseminada aguda (ADEM) e a panencefalite esclerosante subaguda (SSPE).
A ADEM é uma doença desmielinizante que surge durante a recuperação da infecção e é desencadeada por uma resposta autoimune pós-infecciosa. A SSPE, por sua vez, é uma doença degenerativa progressiva do sistema nervoso central, que geralmente manifesta-se entre 7 e 10 anos após uma infecção natural pelo sarampo, possivelmente causada por uma infecção persistente com uma variante genética do vírus no sistema nervoso central.
Diagnóstico de Sarampo
O diagnóstico de sarampo é clínico-epidemiológico. Entretanto, em casos de dúvida diagnóstica, realiza-se o teste sorológico.
A sorologia utiliza a técnica de ensaio imunoenzimático (ELISA) e detecta anticorpos IgM específicos e soro conversão ou aumento de anticorpos IgG. Detecta-se os IgM na fase aguda da doença (dos primeiros dias até 4 semanas após aparecimento do exantema), enquanto os IgG ainda são detectados muitos anos após a infecção.
Notifica-se imediatamente os casos em que os resultados forem de IgM reagente ou inconclusivo e realiza-se a coleta de segunda amostra de sangue entre 15 e 25 dias após a primeira coleta.
Além disso, segundo o protocolo do Ministério da Saúde, a pesquisa para identificação do vírus pode ser realizada em amostras de orofaringe, nasofaringe e urina (coletadas até o 7º dia após aparecimento do exantema, principalmente nos 3 primeiros dias) a partir da técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR). Isso é importante para conhecer o genótipo do vírus, diferenciar vírus selvagem de vírus vacinal e diferenciar casos autóctones de casos importados.
Diagnóstico diferencial
Dentro do universo pediátrico, as principais doenças que fazem diagnóstico diferencial com o sarampo são: eritema infeccioso, doença de Kawasaki, exantema súbito e escarlatina.
Nos adultos, por sua vez, os principais diagnósticos diferenciais incluem: dengue, rubéola e infecção aguda pelo HIV.
Tratamento do Sarampo
Não existe tratamento específico para o sarampo já que, por ser uma doença autolimitada, os recursos terapêuticos visam aliviar os sintomas. Dessa maneira, é de grande importância atentar para a promoção de uma maior ingesta de líquidos e de um amparo nutricional, como também atentar para a administração de antipiréticos.
Além disso, a desnutrição e a desidratação devem ser combatidas com cuidados especiais, hidratação com soro fisiológico a ½ ou a ¼ quando em lactente, sempre com soro glicosado de 5 a 8%, com realimentação precoce, em 12 horas. A vitamina A, por sua vez, também está recomendada, principalmente para os pacientes desnutridos.
Segundo o Guia de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde de 2019, recomenda-se administrar vitamina A, na forma de palmitato de retinol, para todas as crianças diagnosticadas com sarampo, visando diminuir o número de casos graves e fatais, assim como prevenir as complicações da doença.
Para tanto, preconiza-se as seguintes dosagens:
- 50.000UI de palmitato de retinol na forma de solução oral para crianças com idade entre 0 e 6 meses;
- 100.000UI de palmitato de retinol na forma de cápsula para crianças com faixa etária entre 6 meses e 11 meses e 29 dias;
- 200.000UI de palmitato de retinol na forma de cápsula para crianças acima de 12 meses de idade.
Independente do grupo etário, deve-se administrar 2 doses, sendo a primeira no dia do diagnóstico e a segunda no dia seguinte.
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Ficha clínica do Sarampo

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Referências
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