A colangite aguda, também conhecida como colangite ascendente, é uma infecção da árvore biliar potencialmente fatal se não tratada imediatamente. Na maioria dos casos, ocorre devido à obstrução biliar por cálculos, mas outras causas de obstrução do ducto biliar também podem ocasionar a colangite, tais como: neoplasias, estreitamentos biliares, infestações parasitárias e anormalidades congênitas dos ductos biliares.
Epidemiologia da Colangite Aguda
As causas mais frequentes de obstrução biliar em pacientes com colangite aguda são os cálculos biliares, representando até 70% dos casos, estenose biliar benigna (28%) e causas malignas (até 57%). A obstrução maligna pode ser decorrente da presença de tumor na vesícula biliar, ducto biliar, ampola, duodeno ou pâncreas. As estenoses biliares benignas podem ser congênitas, pós-infecciosas (por exemplo, colangiopatia por AIDS) ou inflamatórias (por exemplo, colangite esclerosante primária).
Fisiopatologia
O corpo humano possui mecanismos de defesa para evitar a entrada de bactérias no trato biliar. O esfíncter de Oddi atua como uma barreira mecânica efetiva, impedindo o refluxo duodenal e consequentemente a ascensão de bactérias para as vias biliares. Além disso, a ação da lavagem contínua da bile associada a atividade bacteriostática dos sais biliares ajuda a manter a esterilidade biliar, e a secreção de IgA e a mucosa biliar funcionam como antiaderentes, evitando a colonização bacteriana.
As bactérias são capazes de entrar no trato biliar quando os mecanismos normais de barreira são interrompidos. A obstrução biliar, por exemplo, aumenta a pressão intrabiliar e leva ao aumento da permeabilidade dos dúctulos biliares, permitindo a translocação de bactérias e toxinas da circulação portal para o trato biliar. A pressão elevada também favorece a migração de bactérias da bile para a circulação sistêmica, aumentando o risco de septicemia.
As bactérias também podem passar espontaneamente pelo esfíncter de Oddi em pequenas quantidades e a presença de um corpo estranho, como uma pedra ou stent, pode atuar como um nicho para a colonização bacteriana. As bactérias mais comumente isoladas são de origem colônica, sendo a E. coli a principal bactéria gram-negativa isolada, seguida por Klebsiella e espécies de Enterobacter. As bactérias gram-positivas mais comuns são as espécies de Enterococcus.
Quadro clínico da Colangite Aguda
A apresentação clássica da colangite aguda é conhecida como Tríade de Charcot, que consiste em febre, dor abdominal localizada no abdome superior direito e icterícia, embora apenas 50 a 75% dos pacientes com colangite aguda tenham todos os três achados. A febre e a dor abdominal ocorrem em aproximadamente 80% dos pacientes, enquanto a icterícia é observada em 60 a 70% dos pacientes.
Além de febre, dor abdominal e icterícia, os pacientes com colangite grave podem apresentar hipotensão e alterações do estado mental, fechando a Pentade de Reynolds. A hipotensão pode ser o único sintoma manifesto em adultos mais velhos ou em pessoas que tomam glicocorticoides.
Pacientes com colangite aguda também podem apresentar complicações de bacteremia, incluindo abscesso hepático, sepse e choque.
Diagnóstico da Colangite Aguda
O diagnóstico de colangite aguda é feito se um paciente tem evidência de inflamação sistêmica (com febre e/ou contagem anormal de leucócitos, aumento da proteína C reativa sérica ou outras alterações sugestivas de inflamação) associada a ambos os seguintes fatores: evidência de colestase, com bilirrubina ≥ 2 mg/dL ou química hepática anormal (fosfatase alcalina elevada, gama-glutamil transpeptidase, alanina aminotransferase ou aspartato aminotransferase, até 1,5 vezes o limite superior do normal) e imagem com dilatação biliar ou evidência da etiologia subjacente (por exemplo, estenose, cálculo ou stent).
Exames de imagem como USG e tomografia computadorizada de abdome podem definir a etiologia da colangite, no entanto, o método mais acurado é a colangiopancreatografia retrógrada por ressonância magnética (CPRM), capaz de identificar cerca de 95% dos cálculos biliares maiores que 1 cm, devendo ser realizada sempre que possível.
A avaliação laboratorial para estabelecer o diagnóstico e classificar a gravidade inclui hemograma completo, eletrólitos, painel metabólico abrangente, tempo de protrombina (TP). As hemoculturas devem ser realizadas em todos os pacientes nos quais há suspeita de colangite para ajudar na terapia antibiótica direta. As culturas também devem ser obtidas da bile ou stents removidos na colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE).
Tratamento da Colangite Aguda
Pacientes com diagnóstico de colangite aguda devem ser internados para tratamento hospitalar. Com base na gravidade, os pacientes requerem hidratação intravenosa, correção de distúrbios eletrolíticos associados, analgésicos para controle da dor e antibioticoterapia. Além disso, os pacientes devem ser monitorados para disfunção orgânica e choque séptico.
Em geral, os regimes de antibioticoterapia empíricos para infecções intra-abdominais incluem antimicrobianos com atividade contra estreptococos entéricos, coliformes e anaeróbios. Os agentes antimicrobianos escolhidos devem ser posteriormente adaptados aos resultados de cultura e suscetibilidade, quando estiverem disponíveis.
Cerca de 70 a 80% dos pacientes com colangite aguda respondem ao tratamento inicial com terapia antibiótica. Em pacientes com colangite leve a moderada, a drenagem biliar deve ser realizada em 24 a 48 horas, mas pacientes com colangite leve a moderada que não respondem ao tratamento conservador por 24 horas e pacientes com colangite grave (supurativa) requerem descompressão biliar urgente.
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Referências:
Sabiston – Tratado de Cirurgia – 18ª edição;
Nezam H Afdhal, Acute cholangitis: Clinical manifestations, diagnosis, and management: UpToDate. Acesso em: 28 abril. 2021. https://www.uptodate.com/contents/acute-cholangitis-clinical-manifestations-diagnosis-and-management




