Parto: Um desafio para humanização | Colunistas

Parto_ Um desafio para humanização

Índice

1. Introdução

Quando
se fala em parto, podemos classificá-lo em vaginal (parto normal) e em
abdominal (cesárea), além do uso ou não de fórceps, que é uma ferramenta que
auxilia a retirada do feto da cavidade uterina, quando, por algum motivo, o
feto não é expulso de forma natural.

Durante
o parto vaginal, acontecem eventos fisiológicos que obedecem ao tempo
necessário para todo o desenvolvimento, que se estende de 37 semanas a 41
semanas e 6 dias de gestação. Ou seja, é para ser considerado um processo
normal e fisiológico. Todavia, devido à dor alegada pela parturiente, está
transformando-se em um processo de patogenicidade, necessitando, assim, da
presença de um profissional médico, além de, por vezes, de procedimentos
cirúrgicos e de analgesia farmacológica e não farmacológica. Esses métodos não
farmacológicos para alívio da dor podem funcionar como adjuvantes no momento do
parto, com redução da quantidade de medidas mais invasivas de controle.

Na
linha do tempo do parto, houve várias modificações em relação ao modelo
assistencial. Até o século XVI, as parteiras ajudavam no parto, ao criar um
clima emocional favorável. Ao longo do tempo, outras características se
incluíram, especialmente quando se tratava de parto da realeza, nas cortes
europeias. Nos séculos XVI e XVII, começou a surgir, na assistência ao parto, a
presença do cirurgião e a parteira perdeu seu protagonismo.

Segundo
as Nações Unidas, nos últimos 20 anos, profissionais de saúde passaram a
utilizar, cada vez mais, intervenções desnecessárias no momento do parto. O
Brasil é o 2º lugar no mundo em percentual de cesarianas, segundo dados da
Organização Mundial da Saúde (OMS). Enquanto a OMS sugere em até 15% o número
de cesarianas em relação aos partos totais, na prática, essa percentagem chega
a ser de cerca de 57%. Na rede pública, a cesariana representa cerca de 40%, já
na particular, chega a 84%, o que evidencia uma distorção entre as redes. Para
Faundes (1991), a prevalência aumentada de partos cesáreos no Brasil tem
contribuído para a desumanização da assistência, além de acarretar o aumento da
mortalidade materna e perinatal.

No
Ceará, os índices da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand (MEAC), principal
maternidade do estado, são semelhantes ao nacional, com 58% de partos cesáreas.
Por isso, o governador do Ceará, Camilo Santana, sancionou, no dia 17 de
janeiro deste ano, a Lei n.º 16.837, que institui e disciplina o Estatuto do
Parto Humanizado, que garante a melhor assistência às mulheres em seu período
gravídico-puerperal nos estabelecimentos hospitalares do Estado do Ceará, incluindo
aí os consultórios médicos e de enfermagem, maternidades, salas de parto, sejam
públicas ou privadas, e ambientes domiciliares.

2. Parto Humanizado

Para
se obter um atendimento mais acolhedor e menos intervencionista, um conjunto de
práticas deu origem a um novo modelo de atendimento, que é o parto humanizado.
É realizado com a menor quantidade possível de intervenções, presentes apenas
quando baseadas em evidências e argumentos científicos comprovados. Segundo
Largura (1998), humanizar o parto é respeitar e criar condições para que todas
as dimensões do ser humano sejam atendidas: espiritual, psicológica, biológica
e social.

Esse modelo de parto busca seguir orientações da OMS, do Ministério da Saúde e da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), que, além de estimular a autonomia da paciente, também orienta o clampeamento tardio do cordão umbilical, que ocorre de 1 a 3 minutos após a expulsão total do feto da cavidade uterina, pois isto ajuda a diminuir a prevalência de anemia aos 3 meses, embora costume-se evitar aguardar os 3 minutos devido ao risco de policitemia. No entanto, em certas condições indicativas de reanimação neonatal, o clampeamento deve ser mais rápido, se for pré-termo moderado (idade gestacional menor de 34 semanas); ou imediato, caso haja alteração do tônus muscular ou se houver ausência de choro ou de respiração, o contato pele a pele e a amamentação na primeira hora de vida. 

É
importante ressaltar que o modelo em questão não, necessariamente, será um
parto vaginal, pois também se deve respeitar os níveis de segurança. Se a
parturiente está numa condição indicativa de cirurgia, ela deve realizá-la.

Ademais,
em um parto humanizado, a ação é toda da mulher, que segue o processo
fisiológico do trabalho de parto. O médico se torna um espectador e só
interfere se ocorrer algum problema, porém, está surgindo a figura da doula,
que deve acompanhar e apoiar a paciente durante todo o trabalho de parto. A
assistência com orientações sobre deambulação, bem como a utilização da hidroterapia,
aromaterapia, musicoterapia, cromoterapia, acupuntura, massagens, uso da bola,
relaxamento, auxiliam no conforto da parturiente, com menor presença de dor no
processo de parturição, e configuram exemplos de funções da doula, mas não
devem se limitar a ela, no caso dessa profissional não estar presente.

Em
abril deste ano, a deputada estadual do estado de São Paulo, Janaina Paschoal
(PSL-SP), fez o PL 435/201, que visa garantir à gestante a possibilidade de
optar pelo parto cesariano a partir da trigésima nona semana de gestação, bem
como a analgesia, mesmo quando apresentar condições favoráveis, confirmadas
pelo médico, ao parto vaginal. No entanto, o projeto vai de encontro com a lei
de parto humanizado, sancionada no estado, em 2015, que estabelece que sejam
seguidas as orientações da OMS, inclusive a preferência por métodos menos
invasivos e mais fisiológicos.

Quando
não há parto humanizado, em alguns casos, pode considerar a ocorrência de
violência obstétrica, termo que foi oficializado, no dia 07 de junho deste ano,
para retratar os maus tratos, abuso e o desrespeito que podem ocorrer durante o
trabalho de parto. É importante considerar que indicações bem feitas de certos
procedimentos não devem ser inclusas no termo de violência obstétrica, todavia
a mulher continua com seu princípio de autonomia em aceitar ou não aquela
conduta médica.

3. Consequências para a mulher

            Além
de consequências psicológicas a curto e longo prazo que podem surgir em um
parto não realizado de forma respeitosa para a paciente, a utilização de
procedimentos sem indicação médica podem acarretar iatrogenias, que poderiam
ser evitadas se fossem realmente seguidos os protocolos. Outro problema que
pode ocorrer em um parto não realizado de forma correta é a não escrita do
prontuário e do partograma, um instrumento que representa, graficamente, o
parto. Com ele, é possível verificar a evolução ou não do trabalho de parto e,
assim, indicar condutas de formas mais responsáveis e corretas.

            Com
um parto humanizado, o processo de recuperação é mais rápido, pois, ao
amamentar o recém-nascido, a (neuro) hipófise libera a ocitocina para excreção
do leite, porém, este hormônio também estimula a involução uterina, que
colabora com um regresso mais rápido às mudanças fisiológicas da gravidez.
Outrossim, a amamentação também ajuda a desenvolver o método da amenorreia
lactacional, que consiste em um período de infertilidade pós-parto. Pode
reduzir, também, as probabilidades de desenvolver câncer de mama e de ovário.

            Além
disso, o parto sem complicações, em que é permitido promover o contato imediato
do recém-nascido com a mãe, ajuda a reduzir a incidência do blues
puerperal, que é um momento transitório de tristeza causado pelas modificações
hormonais e pelo receio e insegurança do novo papel da mulher como mãe.
Ademais, algumas pacientes que, de forma precoce, informam que não querem o
bebê, ao realizar o contato pele a pele, são estimuladas a dar carinho àquele
bebê, colaborando com a redução das possibilidades de abandono.

4. Consequências para o recém-nascido

Além
dos benefícios desse contato pele a pele para a mãe, o recém-nascido também se
beneficia, pois, além do carinho promovido, pode ter seu sistema imunológico
ativado pela colonização bacteriana provinda da flora bacteriana da mãe.

A
amamentação na primeira hora também é de extrema importância, pois ajuda a
adaptar o sistema respiratório; estimula a sucção, que facilita a pega mamária;
protege contra a icterícia do leite materno, uma vez que, com a maior ingestão
do leite e o consequente ganho de peso do recém-nascido, impede-se o aumento da
circulação entero-hepática e o consequente aumento da bilirrubina não conjugada;
além de estimular, também, o desenvolvimento do sistema imunológico, que
protege de doenças comuns, como diarreia e pneumonias, e, como consequência,
reduz também a mortalidade infantil. Além disso, o leite materno tem todos os
nutrientes necessários para alimentar o recém-nascido. Por esse motivo, o
Ministério da Saúde preconiza o aleitamento exclusivo até os 6 meses, salvo em
condições que poderia contra indicar essa amamentação, como mães portadoras do
vírus do HIV ou até mães com depressão pós parto, que possam promover risco ao
bebê.

Aqui,
no Ceará, dois exemplos de instituições que estão promovendo o contato pele a
pele e a amamentação nos primeiros minutos pós parto, mesmo se parto abdominal,
é a MEAC e o Hospital São Camilo Cura d´Ars. Já no Hospital Distrital Gonzaga
Mota de Messejana, há projetos para sua implantação oficial.

5. Conclusão

Dessa
forma, é importante estimular, cada vez mais, a realização de métodos que
promovam a humanização do parto e a sua realização de forma que a mulher se
sinta com a maior autonomia necessária, respeitando seus desejos. Todavia, se
realmente um procedimento for indicado, deve-se conversar e explicar a paciente
e seu acompanhante o motivo e como este será realizado. Além disso, devem ser
estudados os motivos para a distorção do número de partos abdominais entre a
rede pública ou privada, já que, normalmente, seriam semelhantes, visto que as
indicações de cirurgias seriam as mesmas, e, após conhecer esses motivos,
estimular, cada vez mais, o parto mais fisiológico.

Por
fim, é considerável a importância do contato pele a pele e da amamentação,
ainda na sala de parto ou centro cirúrgico. Com isso, é importante também que
todo o material para exame físico e prescrição básica do recém-nascido, como
balança, fita métrica e drogas como Vitamina K e Nitrato de Prata sejam
disponibilizados no centro cirúrgico em caso de cesárea. Além da necessidade de
material físico, a dificuldade está no material humano, pois falta profissional
que possa ajudar a mãe nesse processo. Em alguns serviços já se consegue
utilizar a enfermeira da sala de parto, porém, como nem sempre é possível, é
importante que seja definido um profissional competente e, se possível, fixo
para realizar para tal função.

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