Ciclo Clínico

O papel da angiotomografia de coronárias no diagnóstico de pacientes com dor torácica crônica | Colunistas

O papel da angiotomografia de coronárias no diagnóstico de pacientes com dor torácica crônica | Colunistas

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Imagem de perfil de Dr. Carlos Prazeres

1. Introdução

Ao longo dos últimos anos, o valor diagnóstico da angiotomografia de coronárias (AngioTCCor) nos pacientes em investigação de dor torácica tem sido firmemente estabelecido por diversas publicações. A diretriz da Sociedade Europeia de Cardiologia considera classe de recomendação II-a (deve ser considerado) o uso da AngioTCCor nos pacientes com probabilidade pré-teste baixa a intermediária de doença arterial coronariana (DAC). O protocolo britânico de investigação de dor torácica recomenda a AngioTCCor como exame de primeira linha para quadros de angina típica ou atípica, deixando os testes funcionais somente para aqueles pacientes com diagnóstico de DAC. 

2. Angiotomografia de Coronárias e sua habilidade diagnóstica

Para a maioria dos pacientes com quadro de dor torácica, o objetivo principal da investigação é identificar ou excluir a presença de doença arterial coronariana (DAC). O primeiro passo na avaliação desses pacientes é determinar se a dor torácica é anginosa, e se trata de angina típica (3 achados) ou atípica (2 achados): dor em aperto, piora com esforço físico, alivia no repouso ou com nitrato sublingual dentro de 5 minutos.

Para os pacientes com angina confirmada e sem história de DAC conhecida, o segundo passo é avaliar a probabilidade pré-teste (PPT) de DAC usando o modelo de Diamond-Forrester. Este modelo é baseado nas características da doença, idade e sexo. Aqueles com PPT < 10% ou > 90% são considerados de muito baixa ou alta probabilidade, não necessitando de investigação adicional ou sendo encaminhados diretamente para um estudo de cinecoronariografia, respectivamente. A grande maioria dos pacientes têm PPT entre 10 – 90%, de forma que um estudo adicional se faz necessário.

A angiotomografia de coronárias tem se tornado uma ferramenta importante no diagnóstico desses pacientes. O método carrega excelente acurácia diagnóstica para a detecção de doença arterial coronariana nos pacientes com angina estável e probabilidade pré-teste baixa a intermediária de isquemia miocárdica. Os estudos mostram que a alta sensibilidade se manifesta como alto valor preditivo negativo, variando de 95-100%. Isto significa que a DAC obstrutiva pode ser excluída com alto grau de certeza se a AngioTCCor não detectar estenose significativa. 

Com relação a especificidade do método, há uma grande variabilidade entre os estudos, variando de 39% a 99%. Quando o CATE é colocado como método padrão ouro, a área sobre a curva ROC para detectar estenoses significativas foi de 0,97 a 0,98, enquanto a acurácia para o teste ergométrico foi de 0,62 e da cintilografia miocárdica foi de 0,64.

Além disso, diferente dos testes funcionais, como teste ergométrico, cintilografia de perfusão miocárdica, ecocardiograma de estresse e ressonância magnética cardíaca para avaliação de isquemia, a AngioTCCor fornece informações anatômicas de toda a árvore coronariana, permitindo a detecção, caracterização e quantificação das placas ateroscleróticas coronarianas obstrutivas e não-obstrutivas. Isto permite identificar placas ateroscleróticas de alto risco de eventos, como placas com remodelamento positivo, baixa atenuação e ponto de calcificação.

Ademais, estudos comparando pacientes que foram avaliados através de métodos funcionais versus AngioTCCor têm revelado menores taxas de angiografia coronariana invasiva (CATE) sem estenoses. Esse fato é importante, uma vez que os registros apontam que menos da metade das angiografias invasivas são seguidas por intervenção percutânea, isto denota o baixo número de estenoses significativas na grande maioria dos exames. Este cenário permitiu à AngioTCCor ser considerada o método diagnóstico preferencial na investigação de pacientes com dor torácica, e, por se tratar de um estudo com avaliação anatômica, tanto quanto o CATE, proporciona selecionar melhor os pacientes para prosseguir a um estudo invasivo, o qual possui seus riscos inerentes a característica do procedimento.

Não obstante, estudos recentes têm demonstrado o seu papel adicional no prognóstico desses pacientes, uma vez que, identificando doença coronariana subclínica, pode-se iniciar terapia preventiva resultando em menor taxa de desfechos, sobretudo infarto.

3. Perspectivas Futuras

            A despeito da característica de um teste anatômico, a AngioTCCor pode ser usada para avaliar defeito de perfusão miocárdica sob estresse farmacológico, melhorando a especificidade do método e trazendo informações a respeito da repercussão clínica das estenoses coronárias. Nesse sentido, o próprio cálculo da reserva de fluxo fracionado coronariano (FFR) através da tomografia já é factível e vem demonstrando bons resultados, também melhorando a especificidade do método, reduzindo procedimentos invasivos desnecessários, sendo custo-efetivo e mostrando bom prognóstico.