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Hipercalcemia: etiologia, manifestações clínicas e manejo

Hipercalcemia: etiologia, manifestações clínicas e manejo

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A hipercalcemia trata-se de um problema clínico relativamente comum e que pode ser classificada com base nos níveis de cálcio total e cálcio ionizado.

A hipercalcemia é leve quando o cálcio total está entre e 10,5 e 11,9 mg/dL, moderada quando entre 12 e 13,9 mg/dL e grave, constituindo a crise hipercalcêmica, quando os níveis estão entre 14 e 16 mg/dL.

Em geral, a hipercalcemia resulta da diminuição da excreção renal de cálcio, do aumento da absorção intestinal desse eletrólito ou do aumento da reabsorção óssea, sendo essa a ocorrência mais comum. 

Etiologia da hipercalcemia

A maior parte dos casos de hipercalcemia são causados por hiperparatireoidismo ou hipercalcemia da malignidade. Contudo diversas outras hipóteses podem e devem ser levantadas.

Hiperparatireoidismo

O hiperparatireoidismo primário é a causa mais comum de hipercalcemia. Ele ocorre devido a um crescimento anormal das glândulas paratireoides, que produzem excesso de hormônio paratireoidiano (PTH).

O PTH aumenta a liberação de cálcio dos ossos para a corrente sanguínea e reduz a excreção de cálcio pelos rins.

Hipercalcemia da malignidade

As causas de hipercalcemia da malignidade incluem:

  • Mecanismo humoral por excesso de PTHrP: carcinomas de células escamosas, como pulmão, esôfago, cabeça e pescoço
  • Doenças hematológicas malignas: mieloma múltiplo, linfomas.

Imobilização

A imobilização prolongada devido a doença grave, lesão ou repouso prolongado pode levar à hipercalcemia.

A falta de movimento reduz a atividade dos osteoclastos, levando a uma liberação excessiva de cálcio dos ossos para a corrente sanguínea.

Sarcoidose

A sarcoidose é uma doença inflamatória crônica que pode afetar vários órgãos, incluindo pulmões, pele e glândulas paratireoides.

Nas glândulas paratireoides, a sarcoidose pode causar uma produção excessiva de vitamina D ativa, levando à absorção aumentada de cálcio nos intestinos.

Suplementação excessiva de vitamina D

O consumo excessivo de suplementos de vitamina D pode levar à hipercalcemia, pois a vitamina D aumenta a absorção de cálcio nos intestinos.

Manifestações clínicas da hipercalcemia

Independentemente da etiologia da hipercalcemia, os pacientes podem apresentar sinais e sintomas semelhantes. No entanto, além dos próprios níveis de cálcio sérico e da velocidade do aumento de sua concentração, diversas características clínicas podem auxiliar no diagnóstico.

Pacientes com hipercalcemia leve e prolongada podem ser assintomáticos ou podem apresentar sintomas leves e de difícil reconhecimento, favorecendo o diagnóstico de hiperparatireoidismo. Por outro lado, nas malignidades os pacientes têm hipercalcemia severa, com aumento repentino, e seus sintomas são mais intensos e exuberantes, predominando sintomas relacionados ao sistema nervoso central, como confusão mental e letargia. 

Em geral, o aumento dos níveis séricos de cálcio afeta diversos sistemas e órgãos do corpo, mas seus efeitos principais são no sistema nervoso central e nos rins.

Dessa forma, os efeitos renais mais comuns são:

  • Poliúria
  • Polidipsia
  • Urolitíase
  • Nefrocalcinose
  • Entre outros.

No trato gastrintestinal podem ocorrer náuseas, vômitos, anorexia, constipação, pancreatite e úlcera péptica. Quanto a alterações cardiovasculares, é comum bradicardia, hipotensão e encurtamento do intervalo QT. Já as alterações neuropsiquiátricas envolvem confusão, fadiga, ansiedade, depressão, estupor, coma e disfunção cognitiva. Ainda, o paciente pode apresentar fraqueza muscular, osteopenia, osteoporose e dores ósseas.

Ademais, além dos sinais e sintomas apresentados pelo paciente, informações a respeito de sua dieta e das medicações utilizadas são de extrema importância, uma vez que a hipercalcemia pode ser decorrente de intoxicação por ingestão de vitamina D, por exemplo.

Diagnóstico da hipercalcemia

Avaliação laboratorial

Diante da confirmação da hipercalcemia através da dosagem do cálcio sérico, a próxima avaliação laboratorial que deve ser feita é a dosagem do paratormônio (PTH), o qual estará elevado nos casos de hiperparatireoidismo primário e suprimido na maioria das hipercalcemias relacionadas à malignidade.

Em raros casos, o PTH pode estar elevado quando o hiperparatireoidismo primário está associado a malignidades ou quando o responsável pela hipercalcemia foi um carcinoma de paratireoide.

Quando o PTH apresenta níveis baixos (<20 pg/mL), deve-se passar para a dosagem do PTHrP e dos metabólitos da vitamina D (1,25-dihidroxivitamina D e 25-hidroxivitamina D).

Nos casos em que o PTHrP se apresentar em níveis elevados, pode-se confirmar o diagnóstico de hipercalcemia humoral da malignidade, quando os níveis de PTH e de calcitriol normalmente estarão suprimidos.

Demais disso, quando PTH e PTHrP estiverem suprimidos, a dosagem dos metabólitos da vitamina D será de grande importância, uma vez que níveis elevados de calcitriol indicam intoxicação pela ingestão de suplementos dessa vitamina, mas também têm valor na presença de linfomas ou outros tumores que podem produzi-la, além dos casos da produção extra renal como em doenças granulomatosas.

Contudo, é possível que, mesmo com a dosagem de todos esses metabólitos, o diagnóstico ainda seja inconclusivo, sendo de extrema importância a radiografia do esqueleto, mielograma, biópsia de medula óssea, eletroforese de proteínas séricas e urinárias, imunohistoquímica, dentre diversas outras análises que devem ser feitas em conjunto.

Como manejar um paciente com hipercalcemia?

O manejo de um paciente com hipercalcemia depende da gravidade dos sintomas, das causas subjacentes e das comorbidades do paciente.

A hidratação adequada é fundamental para o manejo da hipercalcemia. A administração de fluidos intravenosos, especialmente solução salina normal, pode ajudar a aumentar a excreção de cálcio pelos rins. Em casos de hipercalcemia grave, os diuréticos de alça, como a furosemida, podem ser usados para aumentar a excreção de cálcio na urina.

A calcitonina é um hormônio que ajuda a reduzir os níveis de cálcio no sangue. Pode ser administrada por injeção para diminuir rapidamente os níveis de cálcio em casos graves de hipercalcemia. Já os bisfosfonatos, como o pamidronato ou o zoledronato, são medicamentos que inibem a reabsorção óssea e podem ser eficazes no tratamento da doença causada por câncer ou outras condições ósseas.

Em certas condições, como sarcoidose ou hipercalcemia relacionada à produção excessiva de vitamina D, os corticosteroides podem ser prescritos para reduzir a inflamação e os níveis de cálcio no sangue.

Identificar e tratar a causa subjacente da hipercalcemia é essencial para um manejo eficaz. Isso pode incluir tratamento do hiperparatireoidismo, câncer, sarcoidose, doença de Paget ou outras condições médicas.

Prognóstico da hipercalcemia

O prognóstico da hipercalcemia pode variar dependendo da causa subjacente, da gravidade dos sintomas e da rapidez com que é tratada. Em muitos casos, quando a causa é identificada e tratada precocemente, o prognóstico é geralmente bom.

No entanto, em situações de hipercalcemia grave ou crônica, especialmente quando não tratada, podem ocorrer complicações que afetam o prognóstico.

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Referência bibliográfica

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Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

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