Covid-19: Obesidade como fator de risco | Ligas

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A obesidade é uma doença crônica caracterizada por um acúmulo de gordura corporal, o que por sua vez aumenta o risco para outras doenças crônicas como diabetes mellitus, hipertensão arterial e outras patologias cardiovasculares. 

Foi observado que indivíduos com obesidade apresentam uma atividade imunológica diminuída. Além disso, estudos revelam que o tecido adiposo é responsável pela produção de várias moléculas que influenciam o sistema imune (ex.: adipocinas pró-inflamatórias), induzindo estresse oxidativo e resistência à leptina (hormônio que regula a ingestão alimentar), promovendo uma redução da atividade imune inata e adquirida. 

Vários estudos apontam que os obesos são mais propensos a desenvolver infecções secundárias e evoluir com complicações durante internações hospitalares e, dentre os processos infecciosos, as mais frequentes são as infecções respiratórias.

Em 2009, com a pandemia do vírus H1N1, a obesidade foi reconhecida pela primeira vez  como um fator de risco independente para complicações da influenza. Com isso surgiram vários estudos na tentativa de explicar os mecanismos envolvidos. Foi observado que nos indivíduos obesos há uma menor produção de citocinas para ativação de células inflamatórias e que tais células, quando ativadas, apresentavam uma atividade diminuída. Além disso, esse déficit da atividade imune ocorre de forma mais pronunciada nos pulmões, de tal forma que esses resultados apontam a obesidade como um fator de risco importante para pneumonias. 

No cenário atual, com a pandemia do Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, a participação da obesidade como um fator de risco para essa pneumonia emergente vem chamando a atenção da Obesity Society (Sociedade de Obesidade) e  sendo alvo de muitos estudos.

Os primeiros casos de COVID-19 na China apontavam que os jovens apresentam uma baixa chance de desenvolver a doença, sendo mais afetados indivíduos com doenças crônicas e idosos. Porém, essa estatística mudou um pouco quando surgiram os primeiros casos nos EUA, pois chamou atenção o número considerável de infecções graves em indivíduos mais jovens. Desse modo,  isso aponta para fatores de risco relacionados às diferenças populacionais entre esses dois países. 

Confira a aula feite sobre o assunto:

Dados epidemiológicos apontam que os americanos possuem IMC’s mais altos que os chineses, com prevalência de obesidade nos EUA em 2017 – 2018 de 42,4%. O que, de acordo com estudos do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, está relacionado à ocorrência de quadros de Covid-19 mais graves e a uma maior necessidade de terapia intensiva nos indivíduos com obesidade mórbida (IMC > 40 Kg/m²). 

Além do maior risco para o COVID-19 observado em pessoas obesas, é importante destacar que o gerenciamento de indivíduos com obesidade em unidades de terapia intensiva (UTI) é, por vezes, limitado devido a:

  • Maior necessidade de leitos hospitalares bariátricos (não disponíveis em todos os hospitais);
  • Intubações mais desafiadoras;
  • Maior dificuldade para obter diagnóstico por imagem (devido a limites de peso nas máquinas de imagem);
  • Maior dificuldade para realizar o posicionamento e transporte pela equipe de enfermagem.

De acordo com serviço de saúde de Londres, a cada dez pacientes internados em UTI, sete têm excesso de peso. No Brasil, também foi observado um número expressivo de paciente internados com COVID-19 com excesso de peso, porém ainda não existem dados concretos e conclusivos. 

Dessa forma, além das medidas de isolamento e prevenção impostas à população, é necessário reiterar a importância das pessoas terem uma rotina saudável, se manterem bem informadas, cuidando da alimentação, atividade física e fazendo uso de medicações (quando prescritas) de forma adequada. 

Obesidade e alterações na capacidade respiratória

No grupo heterogêneo que forma a população obesa, estudos já relacionaram a obesidade com prejuízos na capacidade respiratória. Esta mesma capacidade respiratória é fortemente afetada em pacientes com a doença causada pelo novo coronavírus, assim, essa relação pré-existente é mais uma das explicações para a obesidade relacionada a possíveis complicações na COVID-19.

Apesar dos mecanismos que levam a distúrbios da função pulmonar em indivíduos obesos ainda não estarem completamente esclarecidos, os resultados de uma revisão sistemática de 2014 demonstraram que os indivíduos com obesidade apresentaram: 

  • Redução dos volumes e capacidades pulmonares quando comparados a indivíduos eutróficos;
  • Redução da capacidade pulmonar total;
  • Redução da capacidade vital forçada e do volume expiratório forçado após um segundo.

Os trabalhos analisados comprovam a presença de padrão respiratório restritivo associado à obesidade, uma vez que os indivíduos não possuíam doenças respiratórias que o justificassem.

Em indivíduos obesos, alterações estruturais da região toracoabdominal levam à limitação da mobilidade diafragmática e do movimento costal, ambos essenciais para a mecânica ventilatória adequada. O excesso de gordura na cavidade abdominal e no tórax limitam os dois principais movimentos inspiratórios: contração diafragmática, impulsionando o conteúdo abdominal para baixo e para frente, e aumento do diâmetro torácico por meio da movimentação das costelas. 

É importante salientar que todas essas alterações ocorrem em um estado dito normal, quando o indivíduo obeso não está em um processo de adoecimento, sendo, assim, situação pré-existente agravante em infecção por coronavirus.

Obesidade e dificuldades nos exames de imagem, intubação traqueal, cuidado de enfermagem

Pacientes com obesidade têm maior risco de desenvolver complicações da COVID-19, uma vez que a obesidade grave (IMC > 40 Kg/m2, ou IMC > 35 Kg/m2 associada a comorbidades) pode dificultar a realização de exames de imagem por falta de equipamentos adequados a esses pacientes. Também há mais relatos de dificuldade de intubação endotraqueal em portadores de obesidade do que em indivíduos eutróficos. Acredita-se que o acesso às vias aéreas em obesos seja mais difícil do que em não obesos por causa das alterações anatômicas decorrentes do excesso de peso. Nos portadores de obesidade existe uma inversão na relação entre peso e área faríngea, por causa da deposição de gordura nas estruturas cervicais. Além disso, pode haver restrição à abertura da boca e limitações da flexão e extensão da coluna cervical e da articulação atlanto-occipital. 

A obesidade também pode dificultar o manejo e movimentação do paciente e o cuidado de enfermagem, com a internação necessitando de mais cuidados pessoais, aparelhagem, etc. Todos esses fatores aumentam o risco de complicações por infecções respiratórias, como é o caso da COVID-19. 

Alguns dados sobre a obesidade no Brasil

No contexto do tema coronavírus e o paciente com obesidade, é importante conhecermos alguns dados sobre a obesidade no Brasil.

Pesquisa do Ministério da Saúde divulgada em julho de 2019 mostra que o número de obesos no país aumentou 67,8% entre 2006 e 2018, aponta a Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), de 2018. Nos últimos treze anos, a obesidade no Brasil saiu de 11,8% em 2006 para 19,8% em 2018. O país nos últimos três anos apresentava taxa estáveis da doença. Desde 2015, a prevalência de obesidade se manteve em 18,9%. As mulheres apresentaram obesidade ligeiramente maior, com 20,7%, em relação aos homens,18,7%.

Os dados também apontaram que o crescimento da obesidade foi maior entre os adultos de 25 a 34 anos e 35 a 44 anos, com 84,2% e 81,1%, respectivamente.

O Vigitel também registrou crescimento considerável de excesso de peso entre a população brasileira, com mais da metade da população, 55,7% apresentando excesso de peso.

Indicações no isolamento e obesidade

A quarentena imposta pela pandemia da COVID-19 pode ter impactos negativos na obesidade por restringir a manutenção das atividades presenciais dos programas de perda de peso por predispor a um maior sedentarismo devido ao distanciamento social e à proibição de frequentar academias, parques e áreas de lazer; por aumentar o consumo de alimentos enlatados e processados, ao invés do consumo de alimentos frescos. Além disso, o confinamento pode agravar questões emocionais. Assim, além de respeitarem as orientações comuns de isolamento social e higiene para evitar o vírus, é ainda mais importante para as pessoas com obesidade:

  • Se possível, praticar exercícios dentro de casa sempre com consulta a um profissional e apoio a distância; 
  • Manter atenção à saúde;
  • Manter a medicação prescrita e as orientações nutricionais, caso prescritas;
  • Manter cuidados alimentares, priorizando alimentos saudáveis e evitando consumo de processados e industrializados;
  • Confirmar consultas ambulatoriais eletivas antes de sair de casa, visto que existe a possibilidade de cancelamento devido ao cenário atual;
  • Consultar médico em caso de dúvidas.

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