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ASMA NA GRAVIDEZ | Colunistas

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A asma é doença inflamatória crônica caracterizada pela hiper-reatividade brônquica a vários estímulos, incluindo alérgenos, alterações climáticas, medicamentos e infecções. Ela possui caráter intermitente e reversível.

A asma configura-se como a doença respiratória crônica mais frequente durante a gestação, acometendo de 0,4 a 4% das gestantes. Sua etiologia (causa) permanece desconhecida, mas é provavelmente associada a fatores genéticos e ambientais. O quadro clínico da asma pode variar durante a gravidez, sendo que aproximadamente um terço das pacientes apresenta melhora da sintomatologia, um terço apresenta piora e em um terço não se observam alterações. Pacientes com asma grave tendem a piorar e com a forma leve tendem a melhorar. A gravidade prévia da doença parece ser o fator determinante no grupo de pacientes cujo quadro clínico se agrava durante a gravidez. Existe propensão à exacerbação entre 24 e 36 semanas, enquanto que as crises são pouco comuns durante o trabalho de parto devido à elevação de prostaglandinas (PGE) e cortisol.

Os episódios de asma aguda se caracterizam pelo quadro clínico de dispneia grave, sibilos, tosse, dificuldade ao caminhar e ao falar e, frequentemente, retração muscular no tórax ou pescoço. A asma é comumente classificada em leve (intermitente ou persistente), moderada e grave, e as exacerbações graves podem ocorrer em qualquer uma destas formas, sendo mais frequentes nos casos de asma moderada e grave, em que também são mais frequentes as complicações perinatais.

A inflamação brônquica se apresenta como o principal fator fisiopatogênico da asma. Resulta então de interações complexas entre células inflamatórias mediadoras, como por exemplo os mastócitos, macrófagos e eosinófilos, além dos linfócitos Th2, há ainda a participação de células estruturais das vias aéreas. Vários mediadores inflamatórios são liberados, ocasionando alteração na integridade epitelial, aumento do tônus das vias aéreas, hipersecreção de muco e mudanças na função mucociliar. O processo inflamatório crônico pode ocasionar proliferação de células epiteliais e miofibroblastos adjacentes, além de propiciar depósito de colágeno, espessando a membrana basal, culminando com lesões irreversíveis.

O diagnóstico da asma deve ser baseado em condições clínicas e funcionais e na avaliação de fatores desencadeantes das crises. É importante avaliar se há história pregressa de asma, a frequência e a intensidade das crises asmáticas, além da necessidade de uso de medicamentos.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO

  • Sintomas de dispneia, tosse crônica, sibilância e desconforto torácico (um ou mais sintomas), principalmente à noite e ao acordar;
  • Ausculta pulmonar evidenciando sibilos expiratórios;
  • Sintomas episódicos com melhora espontânea ou medicamentosa;
  • Crises geralmente desencadeadas por exposição a alérgenos, exercícios físicos, mudanças climáticas ou infecções respiratórias.

Obs.: O hemograma e a radiografia de tórax são importantes para afastar infecção pulmonar associada.

CRITÉRIOS DE GRAVIDADE

  • Frequência cardíaca > 110 bpm;
  • Frequência respiratória > 30 irpm;
  • Dispneia moderada ou intensa;
  • Uso de musculatura acessória acentuada;
  • Cianose, sudorese, agitação ou confusão mental;
  • PO2<60 mmHg e PCO2 >40 mmHg;
  • Saturação de O2 <95% em ar ambiente (equivale à PO2 fetal <60 mmHg, levando à hipóxia fetal);
  • Acidose respiratória;
  • PFE <50% do previsto.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL NA GRAVIDEZ

Deve-se considerar outras doenças que cursam com dispneia aguda:

  • Hiperventilação da gravidez – pode estar associada à dispneia, porém sem demais sintomas de asma;
  • Pneumonia – observam-se sinais de infecção;
  • Miocardiopatia periparto – realizar sempre em quadros graves de dispneia, avaliação cardíaca clínica e de imagem;
  • Edema agudo de pulmão –  pesquisar terapia tocolítica (os agentes tocolíticos são substâncias responsáveis por inibir as contrações da musculatura lisa uterina e compreendem os agonistas β-adrenergicos; bloqueadores dos canais de cálcio; antagonistas da ocitocina; anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e antagonistas intracelulares de cálcio);
  • Embolia pulmonar;
  • Embolia de líquido amniótico.

TRATAMENTO

Durante a gravidez a asma deve ser tratada tão agressivamente quanto fora do período gravídico, visando prevenir episódios agudos de broncoespasmo e mantendo a função pulmonar e a oxigenação sanguínea o mais próximo do normal quanto possível, garantindo o aporte adequado de oxigênio para a mãe e para o concepto. É imprescindível a monitorização constante do feto durante as crises agudas, avaliando-se sua vitalidade por meio da cardiotocografia (registro gráfico da frequência cardíaca fetal e das contrações uterinas), perfil biofísico fetal (neste exame, observam-se cinco parâmetros biofísicos: os movimentos fetais, o tônus fetal, movimentos respiratórios, reatividade da frequência cardíaca e volume de líquido amniótico) e dopplervelocimetria (permite a avaliação da circulação materna, feto-placentária e fetal). Além disso, a condução dos casos de asma e gravidez requer uma abordagem cooperativa entre o pneumologista, o obstetra e a paciente. As intercorrências clínicas como por exemplo infecções e sinusopatia devem ser evitadas ou tratadas precocemente, e a orientação adequada da paciente é fundamental na prevenção dos episódios de crise aguda.

A prevenção das possíveis complicações deve ser instituída antes mesmo da concepção, em caso de uma gestação planejada, alertando-se as pacientes quanto aos riscos do tabagismo, que deve ser totalmente abolido, e tentando minimizar a exposição aos fatores ambientais que também podem desencadear as crises.

Os objetivos principais do tratamento são: controlar sintomas evitando hipóxia fetal, orientar a gestante sobre sintomas e como evitar fatores desencadeantes, tratamento da crise e de manutenção para manter a função pulmonar normal ou próxima do normal.

O monitoramento da asma na gestação deverá ser mensal, com realização de espirometria na primeira consulta de pré-natal e avaliação de pico de fluxo (peak-flow) nas consultas subsequentes. Gestante com asma moderada e grave deverá ter peak-flow domiciliar. O controle ideal é considerado se PFE > 80%. A gestante deve agendar consulta se PFE 50-80% e procurar atendimento de emergência se <50%. Pacientes com asma grave devem ser acompanhadas em conjunto pelo obstetra e pneumologista.

Os medicamentos utilizados para asma são divididos em duas categorias: medicamentos para melhora da crise (sintomas agudos) e medicamentos de manutenção (evitar exacerbações – controle de sintomas). Os broncodilatadores mais usados são os β2-agonistas, que obtêm adequado efeito na crise, porém, como não possuem efeito anti-inflamatório, não são indicados como tratamento de manutenção se utilizados de forma isolada. O início precoce de anti-inflamatórios pode resultar em maior preservação pulmonar, prevenindo o remodelamento das vias aéreas.

MONITORIZAÇÃO FETAL

A ultrassonografia deve ser realizada precocemente para adequada datação da gravidez, possibilitando acompanhamento apropriado do crescimento fetal. Exames seriados no 2º e 3º trimestres são essenciais se a gestante apresenta asma moderada ou grave ou se há suspeita de restrição no crescimento fetal.

A cardiotocografia e avaliação do perfil biofísico fetal deverão ser realizadas rotineiramente a partir de 32 semanas na asma moderada e grave.

Em caso de exacerbação da asma, é sempre recomendada ultrassonografia após a recuperação.

A amamentação no pós-parto deve ser incentivada. Não há contraindicação para o uso de corticoide, β2-agonista e teofilinas durante a amamentação. Ocasionalmente as teofilinas podem causar irritabilidade na criança. Teofilina é um fármaco destinado ao tratamento e prevenção de broncoespasmo devido à asma e doença obstrutiva crônica de vias aéreas, entretanto não é indicado para o tratamento da crise de asma ou broncoespasmo agudo, além de não dever ser utilizada como fármaco de primeira escolha no tratamento de asma em crianças.


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Copyright © 1997 – 2017 DrPierre d’Almeida Telles FilhoAsma Brônquica. Tratamento da Asma. Anti-inflamatórios na Asma. Disponível em < https://www.asmabronquica.com.br/index.html>. Acesso em 28 Fev. 2021.

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Manual MSD

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