O que precisa saber sobre a candidíase vulvovaginal (CVV)? | Colunistas

Índice

A candidíase vulvovaginal  é uma infecção fúngica, normalmente localizada na vulva da vagina, causada frequentemente pelo fungo comensal das mucosas vaginal e digestiva Candida albicans (numerosos estudos indicam que C. albicans é mais frequente do que as espécies de não C. albicans, respondendo por 80 a 90% dos casos), mas ocorrendo também casos de infecção por Candida spp.

Esses fungos da família candida podem tornar-se patogênicos em determinadas condições  que alteram a normalidade da biota vaginal. Suas principais características são lesões mucocutâneas, fungemia (presença de fungos na corrente sanguínea) e, em casos mais avançados, a disseminação da infecção em outros locais do corpo. [1,2]

Juntamente com a candidíase oral, a CVV é a forma mais comum de infecção fúngica oportunista na sociedade atual e a transformação da fase assintomática da doença para o surgimento das sintomatologias, tanto na área vulvovaginal como na boca ou em outras partes do corpo, indica uma alteração do ambiente ou então uma alteração imunológica, pois isso ocorre quando o fungo sofre transição da forma saprófita para a forma patógena. [2]

Classificação da candidíase vulvovaginal 

A candidíase pode ser classificada em:

CVV Complicada: que tem como características ser esporádica, com intensidade leve a moderada, associada a C. albicans e surgimento em pacientes imunocompetentes; [3]

CVV não complicada: tem como características ser uma infecção recorrente, com intensidade acentuada a grave, causada por espécies não albicans de candida e atingindo principalmente mulheres com comprometimento imunológico e/ou debilitadas (diabetes descontrolado, gestantes, imunodeprimidas). [3]

Candidíase vulvovaginal: sinais e sintomas

O principal deles é o prurido intenso, além de queimação, irritação vaginal ou vulvar (com piora durante ato sexual), corrimento vaginal espesso e esbranquiçado e em pedaços, eritema, edema, escoriações, disúria (em um menor número de casos) e odor fétido. [1,2,3]

OBS: Espécies de não C. albicans apresentam uma importante associação com a ausência de sintomas (ao redor de 44% dos casos)

Principais fatores de risco para CVV

  • Diabetes;
  • Uso de antibióticos de amplo espectro;
  • Uso de corticoides;
  • Gestação;
  • Uso de roupas íntimas apertadas;
  • Imunocomprometimento (AIDS é o maior fator associado);
  • Uso de dispositivo intrauterino (DIU);
  • Uso de anticoncepcionais e terapias de reposição hormonal (orais, injetáveis, adesivos);
  • Período menstrual (maior incidência de casos a partir do pico de estradiol);

Hábitos de higiene inadequados (x. higiene anal realizada no sentido do ânus para a vagina, levando resíduos de fezes para as roupas íntimas, favorecendo o desenvolvimento da CVV).

Epidemiologia da candidíase vulvovaginal 

A CVV é um dos diagnósticos mais frequentes em ginecologia, sendo o tipo mais comum de vaginite aguda nos países tropicais; nos EUA ocupa o segundo lugar, precedido apenas pela vaginose bacteriana. A incidência de CVV varia, indo de aproximadamente 25% na população feminina em geral a 42% entre mulheres adolescentes.

Em um estudo comparativo, foi observada uma incidência de 35,5% para as mulheres sintomáticas e de 15% para as assintomáticas de um grupo controle. Estudos apontam que 20 a 25% das mulheres adultas apresentam colonização assintomática e 75% delas, em algum momento, apresentam algum episódio de infecção clínica em suas vidas.(Pipolo et al, 2007)

Estudo desenvolvido na Universidade de Michigan estimou que provavelmente 55,7% de todas as mulheres terão pelo menos um episódio de vulvovaginite por Candida sp ao longo de suas vidas. Estudo transversal com 774 mulheres, atendidas em clínicas de doenças sexualmente transmissíveis, realizado pela Universidade de Washington em 1998 encontrou prevalência de vulvovaginite por Candida sp de 24%. Na Inglaterra, observou-se aumento dos casos de 28% para 37%, entre 1971 e 1981, monitorado por relatórios anuais em clínicas de DST, ao passo que na Itália, encontrou-se prevalência de 34,1% de culturas positivas para Candida sp em triagem realizada com 2043 pacientes atendidas no ambulatório de Ginecologia da Universidade de Pádua. No Brasil, os dados epidemiológicos são bem escassos. Estudo transversal realizado em 1996, incluindo 72 mulheres não grávidas que procuraram o Serviço de Planejamento Familiar do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, observou a prevalência de candidíase vulvovaginal de 25%, confirmado por cultura. Outro estudo transversal realizado em 1998-1999, que avaliou 205 mulheres atendidas no ambulatório de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade do Espírito Santo, demonstrou prevalência de 25% de candidíase vulvovaginal entre as assintomáticas e de 60% entre as que apresentavam sintomas de vulvovaginite. .(Rosa; Rumel, 2004)

Diagnóstico

Inicialmente é visto que a CVV é diagnóstico presuntivo na maioria dos casos de prurido e irritação vulvovaginal, erroneamente muitos profissionais fazem essa associação principalmente quando junto a essas queixas junta-se a presença de corrimento vaginal.

“Nossa experiência tem mostrado que pelo menos metade das mulheres que nos são encaminhadas com o rótulo de portadoras de CV recorrente (CVR), na verdade, têm seus sintomas devidos a outras causas que não a candidíase. Por isso, um diagnóstico correto é a maior garantia para o sucesso terapêutico.” .(Rosa; Rumel, 2004).

Na prática, existem três tipos clássicos de descoberta de diagnóstico, segundo Simões (2005), primeiramente aquela descoberta ocasional em exames ou consultas de rotina, em segundo lugar, a paciente que está sintomática porém não apresenta histórico do problema (CVV não-complicada) e, por fim, os caso de pacientes com candidiase vulgovaginal recorrente.(Rosa; Rumel, 2004)

OBS: Os fungos da família candidata estão presentes na microbiota vaginal e intestinal, logo, apenas o achado de da cândida em exame de rotina não é fechamento de diagnóstico.

Exames e métodos complementares

Exame a fresco do conteúdo vaginal: usando-se um swab ou uma especula, faz-se a coleta do conteúdo das paredes vaginais, em seguida coloca-se esse material sobre lâmina junto à solução de KOH 10%, por fim, leva-se ao microscópio óptico (nos aumentos de 100x e 400x) para a busca de pseudo-hifas, pseudomicélios e blastosporos. [3]

Exame do conteúdo vaginal com coloração Gram: faz-se a coleta semelhante ao método a fresco, com a alteração de após a deposição sobre a lâmina põe-se o esfregaço para secar, em seguida faz-se a coloração Gram, uma vez corado, o esfregaço deve ser levado ao microscópio óptico em objetiva de 1000x para busca de blastosporos, pseudo-hifas e pseudomicélios. [3]

Papanicolau: este inferior aos dois primeiros, pois possui baixíssima sensibilidade e resultado mais demorado. Coleta-se o material das paredes vaginais em lâmina (com álcool 95%) e colore a amostra, o esfregaço então é montado com a lamínula e encaminhado para o microscópio óptico com objetivas de 100 e 400x. [3]

Métodos menos usados por serem mais novos e custosos são por exemplo: métodos biomoleculares e a cultura em meio de Sabouraud, esse último muito utilizado em casos de CVV reincidentes.

 Tratamento:

O tratamento consiste em antifúngicos (via oral, pomadas, cremes).

Candidíase não complicada:

  • Fluconazol, 150 mg, VO, em dose única;
  • Itraconazol, 200 mg, VO, 2 vezes em 1 dia (total 400 mg);
  • Fenticonazol creme, 5 g, vaginal, à noite ao deitar, por 5 dias;
  • Clotrimazol creme, 1%, 5 g, vaginal, por 7 dias
  • Miconazol, creme, 5g, vaginal, por 7 dias;
  • Nistatina, 100.000 UI, vaginal, por 14 dias.

Candidíase complicada:

  • Fluconazol, 150 mg/dia, VO, a cada 3 dias em um total de três doses.
  • Manutenção de 150 mg, VO, 1 vez/semana, por 6 meses;
  • Ácido bórico, 600 mg, em óvulos, 1 vez/dia durante 14 dias. Deve-se evitar seu uso na gestação.

Prevenção da candidíase vulvovaginal 

A prevenção consiste em manter o equilíbrio do microambiente vaginal. Para isso, recomenda-se evitar usar roupas íntimas durante o período de sono, dar preferência a roupas íntimas, folgadas, de algodão.

Também é importante manter bons hábitos alimentares, como dieta equilibrada evitando-se açúcar refinado e higiênicos, como assepsia da região vulvovaginal e uso de bicarbonato de sódio para alcalinização da região a partir de “banhos de assento”. Por fim, uso racional de antibióticos. [3]

Complicações

Candidíase recidivante (mais de três episódios em 1 ano). Espécies não albicans de cândida e outros fatores (gestação, diabetes descompensado, antibióticos, corticoides, imunossupressores) podem estar associados. [3]

  • Esofagite;
  • Endocardite;
  • Infecção sistêmica;
  • Candidemia.

Mapa mental de corrimento vaginal

Dica de Ginecologia: Resumo de corrimento vaginal - Sanar

Referências:

1 – GOJE, Oluwatosin. Vaginite por candida. Cleveland Oh: Msd Manuals, 2019.https://www.msdmanuals.com/pt/profissional/ginecologia-e-obstetr%C3%ADcia/vaginite-cervicite-e-doen%C3%A7a-inflamat%C3%B3ria-p%C3%A9lvica/vaginite-por-c%C3%A2ndida?query=candid%C3%ADase

2 – Holanda Antônio Arildo Reginaldo de, Fernandes Ana Cristina Santos, Bezerra Christiane Medeiros, Ferreira Maria Ângela Fernandes, Holanda Manoel Reginaldo Rocha de, Holanda Julita de Campos Pipolo et al . Candidíase vulvovaginal: sintomatologia, fatores de risco e colonização anal concomitante. Rev. Bras. Ginecol. Obstet.  [Internet]. 2007  Jan [cited  2020  Dec  14] ;  29( 1 ): 3-9. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-72032007000100002&lng=en.  http://dx.doi.org/10.1590/S0100-72032007000100002.

3 – Bassil L. [Doenças benignas da vagina – CVV]. Tratado de Ginecologia. 2017; [Insira o número do volume(número da edição)]. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788527732406/ [2020 Dec 15].

4 – Rosa Maria Inês da, Rumel Davi. Fatores associados à candidíase vulvovaginal: estudo exploratório. Rev. Bras. Ginecol. Obstet.  [Internet]. 2004  Feb [cited  2020  Dec  15] ;  26( 1 ): 65-70. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-72032004000100010&lng=en.  https://doi.org/10.1590/S0100-72032004000100010.

5 – Simões José Antonio. Sobre o diagnóstico da candidíase vaginal. Rev. Bras. Ginecol. Obstet.  [Internet]. 2005  May [cited  2020  Dec  15] ;  27( 5 ): 233-234. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-72032005000500001&lng=en.  https://doi.org/10.1590/S0100-72032005000500001.


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